domingo, 17 de fevereiro de 2008

Palavras vividas


Foto Ane Baylor.

Catarse é uma palavra forte e rude como uma grande camponesa de mãos quadradas e grossas. Também como a camponesa, tem um veio de consolação e a suavidade da poesia.

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Uma verdade desencarnada e invisível não passa de um vazio.
A verdade de certas pessoas no entanto ressuma dos poros como uma espécie de luz que não se pode ver a olho nu. A verdade só pode ser percebida a coração nu.

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Riqueza é uma palavra de largo espectro, mas não é ambígua. Sempre que se fala em riqueza, fala-se de alguma coisa estimável, que tem um valor por si mesma. Minha avó, por exemplo, chamava a mim e aos outros três netos suas riquezas. Meu pai achava o Rio uma riqueza e se extasiava diante dos recortes e das montanhas de nossa cidade. Mais tarde tive um chefe, um economista que ficou mais ou menos famoso, que adorava dizer essa palavra. Era como se saboreasse uma trufa de chocolate ou um daqueles doces de casamento que só de lembrar dão água na boca. Mas sempre se referia às riquezas materiais, todas traduzíveis em dinheiro.
Aprendi com meu amor que as riquezas que se consegue obter nesta vida, sejam elas de que tipo forem, devem ser cuidadas com o carinho que se dedica a um presente dado por alguém importante para nós. É o jeito mais bonito e mais doce de fruir as coisas boas sem a cobiça, que desfigura a alegria e enfeia a riqueza, nem aquele apego de dono que deixa as pessoas ranzinzas.

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Platão foi um estudante de direito que conheci há muitos anos. Platão Fagundes da Silva era o nome todo dele. Tinha uma cara hirsuta, o coração ameno e estava noivo-de-aliança-no-dedo. Na época, isso era um pouco misterioso para mim, porque não conseguia ver claro a diferença entre namoro e noivado, nem por que este estado devia obrigatoriamente preceder o casamento. Platão no entanto definia uma imagem de noivo que era como uma das idéias puras do outro Platão, o da Grécia antiga. Um bom rapaz, a quem devo essa pequena pacificação sobre o que seria o noivado.

3 comentários:

Jens disse...

Oi Adelaide.
Também gostei daqui.
Bj.

Marcelo F. Carvalho disse...

Riqueza... Está aí uma palavrinha difícil num mundo complicado (ou pobre?). Queria que o mundo tivesse mais riqueza, como os olhos da sua vó.
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Abraço forte!

Moacy Cirne disse...

Adelaide: Não conhecia esse seu blogue. Gostei do que li. Voltarei, se possível. Um abraço.