quarta-feira, 7 de novembro de 2007
Ouro Preto - ladeira acima, ladeira abaixo
Quem não conhece a cidade senão de ouvir falar, não faz idéia. É muita coisa ao mesmo tempo. Pisar o chão dos setecentos, andar entre as paredes profundas e os tetos incríveis de lá, entrar num restaurante vertiginoso que ao mesmo tempo consegue ter os cantinhos e as mesas mais acolhedoras que alguém consegue imaginar, é uma experiência que devia fazer parte do acervo de vida de todo mundo.
Tudo bem que tanta igreja cansa, mas não precisa ver todas de uma vez ou nem todas. Algumas são imperdíveis, como Efigênia, Pilar, São Francisco. Mas tem o horizonte, o céu, as montanhas mais inacreditáveis, o cheiro de forno a lenha. E por cima de tudo, o clima, que mescla cultura refinada com juventude, agito com ecos tão antigos, cenários de romance com a dureza das pedras, brechós de objetos irresistíveis e artesanato com a mais descarada mercadagem pra turista ver. E haja grupos, conjuntos, tribos, eventos, festas, trampos, comidas e bebidas (e quase digo marijuana, mas me calo em respeito a Tiradentes e sua turma careta).
A cidade anda meio cai-não-cai, de modo que é bom se apressar. Além disso, tem favela crescendo. Uma pena. Um motivo de indignação, não pelos habitantes desvalidos, que não têm outra saída, mas por causa dos reponsáveis pelo bem-estar de seus eleitores, largados ao deus-dará, já que os governos não dão mesmo. E a pobreza se agrava. Não aquela pobreza de bem com a vida, que também tem muito por lá, mas a pobreza aguda, que torna as pessoas tristes e duras, e olha a vida com um olhar de ladeira abaixo.
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5 comentários:
Que vontade de ir pra lá agora!
E que prazer a leitura daqui.
Minha admiração.
Que bem descrito, Ouro Preto! Tenho muita vontade de conhecer, dizem que é uma cidade muito portuguesa. Uma espécie de Braga tropical. Senti isso em Olinda, no Recife.
E adorei a sua expressão: "olha a vida com um olhar de ladeira abaixo". Fantástica!
Um beijo
Adelaide, gosto muito de Ouro Preto, mas se voltar a Minas, não deixe de ir à Sabará, mais próxima de Belo Horizonte, e pra mim, o verdadeiro xodó.
Nunca estive em Ouro Preto, nem no Brasil... mas mal posso esperar por conhecer o grande país e essa cidade, que me seduz desde que ouço a música de Sérgio Godinho. Fica a letra, e os parabéns pelo blogue. Convido-vos, já agora, a visitarem o meu. Um abraço!
Ouro Preto
Ouro Preto foi na nuvem transportada
agora não chovia ainda em Minas
mas já a grande mão ali pousava
a mão que moldaria nas colinas
Ouro Preto
Eu vi no ar brilhante a trajectória
das chuvas que trouxeram quantidade
de gestos, arquitectos da memória
aos poucos pondo o rosto na cidade
de Ouro Preto, Ouro Preto
O líquido suspira pela terra
formando gota o casario
as formas que a paisagem não encerra
são corpos que na tarde acaricio
em Ouro Preto, Ouro Preto
Sentado na soleira desmaiado
uni-me com a estátua que me beija
a mão que me talhou, do Aleijado
sentou-me incandescente em sua igreja
Raiz que reconheço também minha
ou âncora por vezes já sem nó
eu chego aqui como antes já não vinha
em Ouro Preto eu não me sinto só
Ouro Preto, Ouro Preto
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