terça-feira, 17 de julho de 2007

Canalha, eu?!


Charge de Coletti.

Nossos heróis morreram de overdose, como disse Cazuza em outro contexto. Como tudo nesta vida tem sempre um lado proveitoso, cabe refletir sobre o assunto, aliás nem tão misterioso nem tão contraditório.
Pode ser que dessa vez a gente aprenda a lição: ninguém é só do bem. Todo mundo tem seu viés canalha. Verdade que alguns exageram. Mas uma coisa mais uma vez ficou clara: não é o hábito que faz o monge, mas pode ser que a ocasião faça o ladrão em muitos casos insuspeitados. E vamos parar com essa mania de explicar as coisas pela latitude. Pode-se estar à direita do meridiano e ser gente boa, assim como podem alguns mais a oeste merecer estima e consideração. E até, por que não, confiança.
As conclusões que pessoalmente tirei das sucessivas crises nas quais andamos chafurdando foram basicamente duas: é indispensável conhecer o passado de um candidato a qualquer posto eletivo, em vez de acreditar nele de graça. E caso não consiga acesso a informações razoavelmente confiáveis sobre o fulano, não votar nele. Ainda que seja preciso votar nulo, o que também é um modo democrático de expressão.
O que me parece antidemocrático e muito ruim, neste momento em que a gente sente tremer a terra pátria, é desacreditar de todos os princípios ou pior ainda, em nome de generalizações capengas desacreditar de tudo e achar que todo mundo é igual. Toda crise, por pior que seja, tem começo, meio e fim. Coisas piores já passaram – duraram até vinte anos, e quem não foi exterminado pôde ver sociedade e história execrando o que durante aquele tempo interminável foi a dura realidade da lei do mais forte.
Ao contrário: agora é que a gente precisa de princípios, de um conceito claro e nítido do que seja ética, que é ciência da ação, onde se analisam como e por que agir de um modo e não de outro. Agora é a lei do mais rico.
O que norteia a ética é a figura do outro, aquele que precisa ser levado em consideração quando se decide fazer alguma coisa. É esse o conceito que as autoridades não se lembram que é preciso incutir nos alunos em nossas escolas, nos currículos das academias que formam profissionais liberais, nos cursos de administração de empresa e marketing ou do que se chama vagamente formadores de opinião. Dá pra entender, porque ninguém dá o que não tem.
Toda carreira tem sua ética própria e específica para viver em sociedade, interagir com clientes, colegas, alunos ou superiores. Mas o princípio é um só, vale pra todo mundo, formado ou não, em qualquer classe social – contanto que seja gente: ser capaz de se pôr no lugar do outro e pensar duas, três ou vinte vezes antes de fazer o que vai atropelar os direitos ou as necessidades desse outro. Seja ele quem for, e ainda que não tenha um rosto conhecido pra nós, nem seja simpático ou estimado. E mesmo que a dinheirama que vai servir a esses direitos e necessidades esteja aí, à vista e ao alcance da mão.
Talvez seja esse o jeito mais eficaz de controlar o viés canalha que todos nós – mas todos mesmo – possuímos.

3 comentários:

Lord Broken Pottery disse...

Adelaide,
Concordo, assino em baixo. As generalizações tornaram-se regra geral. Em todas, absolutamente todas atividades, existe gente honesta, do bem, querendo construir. Não podemos tirar os bons pelos maus. Até porque seria a maneira mais rápida dos canalhas vencerem.
Beijo

Anônimo disse...

Realmente, há safardanas a leste e oeste (como sempre existiram ao norte e ao sul); a coisa está para além da posição ideológica e/ou econômica. E somos todos canalhas, é verdade, embora eu seja um pouco menos que a maioria (minha santa mãezinha que o diga). Mas o que me encasqueta nesse debate todo em torno do debate ético é justamente essa bola que você levanta: é preciso saber (e querer) se colocar no lugar do outro. Adelaide, eu que sou o rei do pessimismo, te digo: é aí que a porca torce o rabo.

Trabalho em escolas públicas há muito tempo e discussões éticas nesses espaços, por mais paradoxal que pareça, estão longe de avançarem, só para você ter idéia... Mas seque a vida. Um abraço.

P.S. Rock'n'roll will never die? Oh, yeah!

Nina disse...

concordo com vc em gênero, número e grau, adelaide.
O pior do mal é o mal que ele desperta em nós, o que nos faz ignorá-lo, tanto do lado de dentro quanto do de fora.
´só reconhecendo nossa própria maldade podemos enfrentá-la eticamente - dentro e fora de nós.
beijão
Nina