segunda-feira, 21 de junho de 2010

Já dizia o Eclesiastes

A vaidade está se tornando uma espécie de inversão do óbvio. De defeito, está passando a qualidade reconhecida pelo senso comum e pacificamente aceita e aprovada. É até engraçado, às vezes, analisar o perfil do vaidoso assumido, desses que se adora e projeta sua imagem num halo de perfeição, que está convencido de que deve ser admirado, como se isso não fosse mais que uma obrigação do resto dos mortais.
Para quem tem um mínimo de senso crítico, o vaidoso é antes de tudo um ridículo. Mas a causa desse fenômeno de crescente envaidecimento da humanidade deve ter mais de uma explicação, como em geral acontece em tais casos. Obviamente a primeira causa deve estar na crença de que é a exposição o caminho mais curto para se obter sucesso e grana. Dá certo para muitos, por que não daria para ele? Como esses caras chegaram a ser considerados VIPs, como conseguiram a fama, tornaram-se celebridades e ídolos de multidões histéricas? Quem embarca no trem da vaidade nem cogita de investigar o que esses bem-sucedidos fizeram antes de chegar lá, como investiram em suas carreiras, quanto tempo de formação e trabalho tiveram para conseguir o lugar que ocupam agora.
Outra causa, talvez menor, mas igualmente eficaz, seria o incensamento da autoestima. Um duplo mal entendido, talvez, porque autoestima não consiste em se julgar melhor que o resto da espécie, e sim em estar bem consigo mesmo, viver a difícil paz interior, gostar da vida, sem alimentar mágoas nem sentimentos paranóides de inferioridade. Outra pode ser a crença, muito difundida hoje em dia – mas também muito simplória – de que aquele não se enaltece não consegue nada de bom neste mundo. Será mesmo?
O chato de dizer tudo isso é que fica parecendo uma pregação de moral, o que não é absolutamente o caso. Mas a fumaça de vaidade que se respira a todo momento parece mais densa do que nunca. Dá vontade de perguntar – o que você fez para se apresentar assim, tão arrogantemente convencido de seus dons de saber, beleza ou talento? Porque nada de muito sólido se consegue nesta vida sem um tempo significativo de dedicação, esforço e trabalho. E tais créditos nunca dispensam uma boa dose de humildade, no bom sentido de simplicidade, consciência do próprio lugar no mundo e disposição para encarar as limitações a que todos, cada qual a seu modo, mas sem exceção, estão sujeitos. Chegar a superar essas limitações exige coragem e luta, paciência e lucidez – valores que nenhum vaidoso vive de fato ou quer conhecer de perto.

13 comentários:

jurisdrops disse...

Muito pertinente, Dade. Os vaidosos me fazem lembrar o som da vuvuzela!
Beijo

Myrela disse...

Interessante ponto de vista!
Não sei se parto do seu ponto, mas a vista, vista do seu ponto é mesmo interessante.
Saudações!

Roberto Costa Carvalho disse...

Bom dia, Dade!
Vaidade, perfeição, aparências, amor pela própria imagem, conquistas sem esforço, consumismo... E ouso acrescentar este pouquinho: o esquecimento da vida, exatatamente isto, o esquecimento da vida, do acontecimento do mundo.

Tania regina Contreiras disse...

Posso simplesmente "assinar embaixo" do seu texto? Nossa, concordo totalmente com cada palavras sua, viu? E parabéns por ter expressado tão bem isso que certamente é o pensamento de muitos.
Abraços,
Tânia

Estela disse...

Olá,
Vim te convidar a visitar São João no meu blog "Guardados e Achados".
Bjs.

Mari Amorim disse...

Sábias e belas palavras,Dade.
É sempre bom vir aqui.
Grande abraço,boas energias,
Mari

Milena Magalhães disse...

Puxa vida, dade, que ponto de vista interessante. Aprendo sempre tanto vindo aqui.

Parece mesmo que o mundo todo esqueceu o quanto é importante o tempo para maturar seja o que for. O que sobram são apenas os factóides, o oba-oba...

Um abração.

Fábio disse...

Olá gostaria de convidar a conhecer meu trabalho através do blog Ecos do Teleco Teço (WWW.ECOSDOTELECOTECO.BLOGSPOT.COM) . Grande abraço e sucesso com sua proposta !! Axé

Gerana Damulakis disse...

Concordo. Principalmente com o ponto sobre a valorização da pessoa, não para "se achar melhor que os outros".

Eu li tanto Glória hoje que, ao entrar aqui, senti muita intimidade com o estilo.

Anônimo disse...

Pois é Dade, eu há muito penso sobre isso, tamanha a minha vaidade. Pq quando me ofendo, é vaidade. Quando me acho passada para trás, é vaidade. Quando me acho injustiçada, é vaidade. E quando minha auto-estima despenca, eu não sei pq....hehehe.

Menos vaidade, mais consciência de si mesmo.

Anônimo disse...

¡Hola buenas!

Acabo de ver tu blog y para mi es interesante y tengo que felicitarte, te animo.

Mi blog es: http://sordobierzo.blogspot.com/

Muchas gracias.

Un saludo

Anônimo disse...

Dade,

Alguns textos teus leio mais de uma vez... E fico sempre com a ideia a ser refletida por vários momentos do dia. Neste assunto, penso eu que as sociedades modernas que supervalorizam as "embalagens" em detrimento do conteúdo - e isso se aplica ao material humano - infelizmente, têm pregado como caminho para a felicidade ou realização pessoal, além do "ter", o "parecer"!
É cada vez mais difícil encontrar alguém que "É". Mas pessoas que "parecem" há aos montes.
O que assusta mais é o modo como as pessoas absorvem a ideia vendida, e compram-na sem pestanejar. Até parece que têm medo de uma nova forma de exclusão que se vive hoje: aqueles à margem de padrões e estereótipos.
A vaidade dá muito lucro a quem a modela. E quem a vende deve sentir-se vaidosamente todo poderoso, porque aniquila arte, aniquila essência, aniquila talento, aniquila personalidade. Exemplo disso é ver como nas novelas cada vez mais entram em atuação [mais parece figuração], modelos e recém-saídos de programas de reality shows. Não se tem mais espaço para os genuínos, os autênticos, os verdadeiros artistas, despojados de imagem mas providos de verdades.
A vaidade desespera... jovens frustrados, senhoras cheias de traumas, homens patéticos... Todos a tentarem ter uma identidade que afinal não diz nada além do copiável.
A vaidade também é traiçoeira, e quando se a impõe com extrema arrogância, corre-se o risco de se afundar mais ainda no narcisismo solitário do fundo do lago.

Querida Dade, é um assunto para todos nós pensarmos, repensarmos e pesarmos. Afinal, quem não pode estar prestes a cair neste lago e nem percebe?! Ego é palavra pequena demais para querer ser maior que humildade, não é?!

Meu abraço e minha total admiração pela lucidez, sensatez e propriedade com que abordas cada tema.
Há passagens neste teu texto que levarei sempre comigo, em acústico. És sempre uma lição, e o bom é que nos instigas a estudá-la em casa, no cotidiano, de forma a contextualizar o que se assimila. E quando se promove assim um debate, é como na escola: aprende-se a pensar, aprende-se a aprender.

Um beijo.

Katyuscia

Celso Ramos disse...

Olá Dade!!!
É...realmente vivemos um tempo em que não se tem mais vergonha de não fazer esforço...Essa história começa bem cedo dentro de casa.(e hoje a permissividade anda a solta)
O moleque ou a molequa não podem ser mais contrariados, se não "trauma". Vontades feitas, choradeira momentaneamente controlada, você tem alguns engredientes para os vaidosos em potencial...aqueles que não aprenderam a ouvir um NÃO!!! e só conheceram o SIM. Somoa-se a isso aquela nossa velha maquina de fabricar desejos que em todo tempo-espaço está a nos bombardear!!!!
Ps. diminui a frequência porque estou curtindo umas férias em família!!!