A dupla dor-delícia de ser quem se é e a serenidade são gêmeas bivitelinas. Conhecemos bem as diferenças entre ambas, e no entanto nos passam certo sentimento de univocidade – como dois conjuntos matemáticos com uma área em comum que de algum modo os define. São duas, mas uma precisa da outra para existir inteira.
A experiência mais completa de existir e a serenidade são semelhantes ao que os químicos chamam de elementos simples, irredutíveis. Convivem em harmonia e criam intervalos de prevalência; equilibram-se na gangorra dos dias, uma ajudando a definir e identificar a outra. Fertilizam a argila de que somos feitos como o adubo e a água fazem com a terra que recebe uma planta.
Só se vive plenamente sendo capaz de mergulhar nessas duas instâncias. Uma é necessária à outra; são como espelhos com sinais trocados, e por isso podem se contemplar e fortalecer mutuamente. Sem serenidade a experiência de estar vivo é menos intensa; os acontecimentos não se desdobram de todo, não mostram todas as faces que resultaram naquele e não em outro acontecimento. Entendem-se os motivos pela metade, criam-se julgamentos apressados, falhos, e fica muito fácil distanciar-se das pessoas por não ser capaz de compreendê-las. Sem serenidade (essa paz de dentro, que independe de sossego externo e até da própria paz social), o ego toma conta da situação – e o ego pode ser considerado uma instância emburrecedora por excelência.
Nem é tão difícil criar esse estado interior a que chamamos de serenidade. Começa com um olhar sinceramente interessado no que vai dentro de si; olhar-se como se fosse “de fora”, imaginando ver outra pessoa e suas alternativas. Outra vantagem da serenidade é recriar a solidão como quem decora uma casa, ver novidades até no dia-a-dia, reavaliar a rotina, tornar o tédio um sentimento mais distante. Sozinho ou acompanhado, é possível aproveitar melhor o que a vida oferece de bom quando se é capaz de relativizar os maus momentos.
E como é improvável, senão impossível, que alguém consiga atravessar a vida sem sofrimento, ao menos vai encontrar em si um espaço mais confortável para seu próprio uso e para quem estiver próximo, porque a serenidade é resultado de uma espécie de ginástica interior, e dá força e agilidade mental a quem a conquista.
23 comentários:
Gosto muito do seu blog.
Obrigada.
Cara amiga.
Muito profunda esta leitura.
Penso que o sofrimento não deve ser visto como algo comum, mas embora raro, é necessário para nos tornar mais fortes, e entender a beleza da vida em sua plenitude.
Semana de muita ternura para ti.
Vim lhe desejar um Feliz Natal e um Ano Novo repleto de Amor.
Bjs.
Dade,
uma vontade de sorver... fui lendo e me apropriando das vírgulas, não queria o ponto final, precisava de um tratado sobre o tema, mergulhei profundamente.
Obrigada!
Muito bom. Adorei ler este texto, trouxe uma mensagem boa, um lembrete, um alerta. Vc é ótima.
Remeto a postagem Lisboa nos habita para seu blog, a próposito de Enrique Vila-Matas.
Oi, Dade, tenho buscado a serenidade (ops, rimou!) como uma espécie de mantra. Talvez tendo fé, o que eu tenho e não tenho! Gostei do seu blog, dessa reflexão em processo. E adorei a sua visita ao Blag!
Maravilha, amiga.
É sempre um prazer vir ao seu blog.
Beijos
Muito bom... ginástica mesmo, há que se exercitar ... acho que já o fazemos um pouco através da poesia não querida?
Gosto imensamente daqui;)
bjo grande!
Gostei imenso deste texto sobre a serenidade, essa que só dentro de nós se encontra e é até capaz de recriar a solidão.
Um grande beijo.
Dade:
Agora não vou ler mais nada, para deixar a serenidade que captei aqui continuar comigo. Essa ginástica, busco-a diariamente; é a que exige maior empenho e a que oferece os melhores benefícios.
Adorei seu texto.
Beijo.
Estou fora por uns dias, dei apenas uma passadinha rápida para agradecer sua visita. Gostei muito do que ví aqui.
Obrigada e Boas Festas.
Dade,
Gostei do texto, como sempre, mas me parece um pouco a busca da utopia. A serenidade é um estado transitório, pode durar mais e menos tempo. O ser humano é ansioso por natureza. De qualquer maneira é um bom alerta. Não há dúvida de que felicidade e serenidade estão muito ligadas. Só não tenho certeza quanto a qual dos dois estados chega primeiro.
Beijo
Olá amiga.
Passei novamente para desejar-te um feliz natal.
Que o Natal reafirme em ti a certeza:
Não somos parte do amor,
somos o próprio amor.
Que possamos envolver nossas famílias, amigos e humanidade com a força deste sentimento.
Estrelas de paz brilhem em ti.
Dade,
Boa reflexão
É o sofrimento que nos deixa mais forte e nos dá coragem para enfrentar desafios. E acho que é com a vitoria que sentimos aquela dor-delicia que nos trás aquela serenidade tão almejada.
A você e sua familia meus votos
de um F ELIZ NATAL pleno de luz e muita saude.
bjs
Dade, vou chegando aqui com a sensação de chegar atrasada. Vim agradecer sua visita, encontrei muitos é-amigos nos comentários. Por enquanto vi o texto de hoje. Pretendo voltar. "a serenidade é resultado de uma espécie de ginástica interior, e dá força e agilidade mental a quem a conquista"
Valeu!
Oi Dade,
Meu pai era um ser sereno assim admiro por gosto a serenidade.E você a detalhou tão bem.Fui caminhando com você na trilha deste estar em serenidade,entendendo ,alargando a consciência .Obrigada,você me agra
ciou com o tom da serenidade.
À você que me lê com o coração,
Suspiro pelo ano que se encerra e nos permite tempo de pausa para reflexão.
Durante um tempo longo fui sentindo,sentindo... as vibrações que circulavam ,claras e obscuras,
rápidas demais,fortes e frágeis,distintas e misteriosas,espertas e inocentes,confiantes e assustadoras,enfim
carreguei por todos os lugares um texto ,um amarrado de palavras que a cada noite se desvanecia,depois se encorpava,até que finalmente em uma tarde
se fez nascer ..."ANTES de TUDO".Senti alívio e o contemplei prosa a se dizer poema com olhos amorosos de mãe quando vê seu filhinho pela primeira vez.
Agora este texto é seu,meu presente de Natal,leia sem pressa,o examine lentamente,deixe-se ser tocada por êle.
Envolva-se com a sinceridade transparente com que o escrevi, com a delicadeza,com o tom suave e meditativo.
Compreenda o amor e a dor do texto,o luto e o nascimento ,a coragem a clamar por bravura,a solenidade,o consolo,a humanidade em nós semelhantes.
"Antes de Tudo"...postei no www.cristinasiqueira.blogspot.com
Feliz Natal
Cris
Dade, pra dizer que é sempre MUITO BOM visitar seus blogs e textos. Estava com saudade, e lá da minha nuvem envio um abraço caloroso de Natal e Ano-Novo.
Cara Dade,
Desejo a você um Natal repleto de alegria, saúde, paz e, sobretudo, muito jazz.
Um Feliz 2010, cheio de felicidade, sucesso e realizações!
Dade; um Natal feliz. Receba meu beijo e minha admiração.
Um grande, grande abraço Adelaide!
Tudo, para si,
Gisela Rosa
Dade,
Volto para desejar Bom Natal, e feliz 2010.
Beijo grande
Bom texto. Valeu a pena lê-lo.
Obrigado.
Que lindo! Amei o texto e tb a foto desse momento mágico e único em que a mãe contempla sua cria...show!
bjs e feliz 2010!
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