terça-feira, 10 de novembro de 2009

Um estranho para amar



O tema é delicado. Envolve um tipo de relação humana muito rica e difícil, em que um ou dois adultos resolvem assumir como filho alguém cujos pais não quiseram ou não puderam criar. Mas é também importante e necessário, já que pode ser a oportunidade de resgatar o que se considera o fator maior para o equilíbrio psíquico e afetivo de uma criança: conviver e sentir a segurança de uma família estável.

Não vou falar do ato legal e burocrático, quase sempre cego e surdo ao coração; é um ato necessário, mas dependente do tipo de racionalidade de quem interpreta os fatos e lida com o texto da lei. Também não se deve esquecer que há manipulações nesse ato, e que o próprio pretendente à paternidade/maternidade pode esconder interesses bem distantes – e até contrários – daqueles do menor que está reivindicando.

Mas a adoção consciente, feita por pessoas que querem dar um destino digno a seus próprios sentimentos e transformar alguém em um filho, é um dos atos humanos mais próximos da idéia de Deus que temos em nós. Nada e ninguém obrigam a isso, e no entanto há quem assuma esse compromisso para toda a vida, diferente de todos os outros; um compromisso mais pesado e mais doce que um casamento, de resultado incerto. Mesmo assim, quem não desanimou e persistiu até conseguir realizar o que desejava, e enfrenta tantas dificuldades até abrir o espaço necessário para que o pequeno estranho seja transformado em filho pelo amor e pelo desejo, só pode ser gente boa, dessa que salva e redime o resto da humanidade.

Ninguém é obrigado a isso, no entanto. Há quem prefira gerar embriões que serão congelados e na melhor das hipóteses prover a medicina de células-tronco. Um destino útil, sem dúvida, mas não a vida do jeito que a conhecemos e experimentamos, do jeito que a desejamos para alguém que se ama como filho. Há outras fontes de células-tronco, que agora a ciência já consegue até duplicar artificialmente.

Acredito que todos temos em nós essa potencialidade de ser pai ou mãe. Se por algum motivo ela não se concretiza num filho biológico, e diante de tantas crianças órfãs, abandonadas e maltratadas pelos pais e/ou pelos estranhos que lidam com elas, é quase instintivo que se procure aproveitar esse espaço para tirar um ou mais desses menores do estado de abandono, dar a eles um futuro digno e uma chance de felicidade.

10 comentários:

Anônimo disse...

Dade,

não sei se é este o blog que sofreu modificações, mas caso positivo, esta muito agradável visualmente!
Vou visitar seus outros blogs!
Obrigado por ter comentado no Varal!
Volte sempre!

Gisela Rosa disse...

Gostei muito de ler o seu texto dade. Fecundo e sensível. Um beijinho e obrigada por suas visitas

Marcelo F. Carvalho disse...

Complicado mesmo, Adelaide. Tenho amigos que, por não conseguirem ter filhos (pela via "normal" ou científica), entraram na fila da adoção... E isso já dura algum tempo.
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Eu achava estranho demais a longa espera, mas hoje, vendo-os, acho apenas estranho. Compreendo o tempo que se dá para o casal perceber se é isso mesmo, se a estrutura psicológica consegue aguentar (principalmente por causa da pressão negativa da família).
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Ótimo texto!

Flor de sal disse...

Dade,

uma dádiva ler o seu texto hoje, é um ato de amor grandioso e intimamete desejaria que algo assim me pudesse acontecer...

Gerana Damulakis disse...

Eu tenho uma filha, nascida do meu útero. Sempre pensei em ter outra(o), nascida(o) do meu coração. É muito difícil, ainda mais para quem já é mãe.

jurisdrops disse...

Dade: de sensibilidade iluminada seu texto. Acredito também que os que adotam chegam mais perto de Deus! São corações grandiosos.
Beijos,
Maria Teresa

Barbara disse...

SE em vez de cobrar imposto de renda de assalariado, o governo indicasse que cada família adotasse uma só criança, tudo sairia mais leve para todos e em todos os sentidos.
Ao menos o $$$$que não é usado "nos conformes", transformaria uma vida.
Mas, quem ousa?

Roberto Costa Carvalho disse...

Muito pertinente seu texto, Adelaide. Como você mesma diz, tema delicado. E acrescento: muito delicado.

Nos abrigos de órfãos, os pequeninos olhos são de discriminados, dos encaminhados para a idéia de que "a vida é assim mesmo". Isso dói, dói muito!

Parabéns por seu trabalho! Gosto muito de seus textos, embora sejam raros meus comentários. Tudo é dito de forma tão clara, que eles se tornam dispensáveis, não é verdade?

Cadinho RoCo disse...

Entendo como delicadíssimo o tema adoção.
Cadinho RoCo

Kyria disse...

Muito bacana a forma como você abordou este tema tão delicado. Para se adotar há que se ter disponibilidade, acima de tudo, de coração. Gostei muito deo seu blog e "linkei" no meu, parabéns e bjs.