
Um tipo de paz que não depende muito do que acontece em volta de nós é a chamada paz interior. E que coisa será essa, a paz interior? Será que não somos sempre um reflexo do que está a nossa volta? Não funcionamos sempre como um espelho do ambiente em que vivemos?
Em grande parte, sim, é claro. Refletimos a agitação, a pressa e o estresse do mundo em que estamos mergulhados e do qual participamos. Principalmente para quem vive nas grandes cidades, fica difícil ou impossível fugir ao agito do trânsito, dos horários apertados, do entendimento difícil entre as pessoas e da violência que, mesmo quando não é explícita, está sempre latente.
Então, em que consiste essa coisa de paz interior? Os mais estressadinhos vão logo descartando a expressão como uma bobagem, uma utopia entre tantas. O mundo vive em guerra, são muitas as guerras que constantemente nos assolam. Mesmo longe de nós, uma guerra persistente e complicada como a do Iraque ou a que se instalou no Oriente Médio, os choques frequentes entre grupos antagônicos, nos países próximos de nós e no próprio Brasil, por exemplo, chegam sem parar pelo noticiário da mídia, por comentários a nossa volta, pela internet. Mesmo supondo que não houvesse guerras em algum momento, a memória e os ecos de conflitos passados seriam suficientes para nos mostrar que o ser humano é belicoso e sempre insatisfeito.
No meio de tumultos e até no próprio cenário dos confrontos, no entanto, há pessoas surpreendentemente pacíficas. Pensou em Nelson Mandela? Em Gandhi? No Dalai Lama? Em dom Hélder Câmara ou Martin Luther King?
Alguns nomes, mais conhecidos por suas atividades profissionais ou artísticas, também foram ou são grandes amigos da paz – Einstein, Oscar Wilde, Nietzsche ou John Lennon; alguns são menos conhecidos, como Uri Avnery, jornalista e líder do Bloco da Paz; Nurit Peled-Elhanan, professora de literatura comparada da Universidade Hebraica de Jerusalém e uma das fundadoras da associação Bereaved Families for Peace; o sociólogo polonês Zigmut Balman, autor de Modernidade Líquida, cujo pensamento vale a pena conhecer; o diplomata brasileiro tragicamente morto em seu posto de trabalho, Sérgio Vieira de Mello, fervoroso humanista e defensor da democracia, e mais uma infinidade de pessoas de todas as nacionalidades, cujos nomes ignoramos ou de quem pouco ouvimos falar, que vivem e trabalham pela paz com suas atitudes, atos e palavras.
Por que essas pessoas são capazes de criar ilhas de paz até em ambientes subvertidos e destroçados pelas guerras mais violentas? O que lhes dá força para sustentar essa luta diária, incessante, pela instauração da paz?

Quem pensa, deseja ou consuma a morte do outro por interesse ou revanche; quem resolve seus conflitos ou impasses por meio da violência e da destruição; quem agride por qualquer motivo, quem se julga acima do bem e do mal; quem ainda se acha melhor ou mais importante que o resto dos mortais; quem não hesita em ir às últimas consequências para conseguir o que lhe parece direito seu; quem ignora o bem-estar alheio e agride os sentidos dos vizinhos com o som aos berros, sua falta de higiene ou dizendo o que quer e não suportando ouvir o que não quer; quem interfere futilmente na vida alheia e não leva em conta os direitos do outro, esses são exemplos clássicos de mortos-vivos. Não se trata de mera delicadeza ou refinamento, considerados por muitos como frescura. Trata-se de concretamente pensar nas consequências desagradáveis ou desagregadoras de seus atos, no prejuízo ou incômodo – às vezes desproporcionalmente maiores – que esses atos vão causar.
